A criatividade e o minimalismo entraram num bar...

28 janeiro 2019

Depois de uns dias ausentes do nosso cantinho online por motivos profissionais, estamos de regresso, desta vez para falar sobre o tema do costume - a criatividade - em relação a um conceito que tem estado nas bocas do mundo e que gera as mais contraditórias reações: o minimalismo. 

Embora o Artur tenha uma predisposição natural para este movimento, eu sempre me considerei uma apaixonada da tralha. Já falei aqui da coleção de porcos, de bolas de neve, de objetos vintage, de postais, das cartas, das fotografias, da caixa das recordações onde guardo até recortes de revistas com os meus ídolos da juventude... Enfim, a última coisa que seria de esperar é que, nesta fase da minha vida, me fosse interessar por um conceito que é em tudo avesso a esta tendência para acumular: o minimalismo. 


 A noção não é propriamente nova para mim, mas até agora olhava para ela com alguma descrença: Abdicar de coisas materiais? Viver numa privação daquilo que me traz boas memórias? Sacrificar os objetos pelos quais tenho tanto carinho para viver num loft de paredes brancas e sem decorações? Don't think so.
Além disso, para mim, o minimalismo esgotava-se nesta parte material, de uma quase irradicação de tudo o que fosse coisa. Mas ao que parece, estava errada. 


O que dizem os meus novos companheiros de viagem casa-trabalho-casa, Joshua Fields Millburn e Ryan Nicodemus do podcast já não tão novo assim, mas novo para mim, The Minimalists Podcast, é que, na nossa vida, seja externa ou internamente, só deveremos guardar o que faz falta. Tão simples quanto isto: se traz alegria e funcionalidade, fica, se traz ansiedade e não é útil, sai fora. 

Portanto, se as minhas 46 bolas de neve me trazem alegria, se a presença desses objetos me inspira, satisfaz e preenche, não têm de sair. O mesmo para os porcos, os postais, as cartas, as relações, os sonhos, os objetivos, os projetos de vida, etc, etc. Mas se, por alguma razão, alguma coisa (ou relação, ou objetivo) que possuo não me traz satisfação e bem-estar, então está a ocupar espaço desnecessário que impede a liberdade de valorizar outras coisas que podem ser mais importantes. Esta é a noção de minimalismo que passei a conhecer e com a qual me identifico: procurar valor nas coisas, materiais e não só, que possuo (ou que desejo adquirir mas que sei que terão utilidade e um lugar importante na minha vida) e libertar-me do excesso que me impede de ver com clareza aquilo que me traz alegria e bem-estar. 

E onde é que a criatividade entra aqui? 



Mais uma vez, em duas frentes: na exterior, mais fácil de identificar, e na interior. 

O espaço, uma porta aberta para a mente criativa 

A criatividade não tem de surgir num ambiente caótico, desorganizado e lotado. A ideia de que os projetos e as obras criativas nascem num atlier desarrumado, cheio de tintas e maços de tabaco vazios é alimentada por filmes, livros e séries, mas na verdade, está mais do que provado que um ambiente organizado, que nos permita encontrar serenidade e clareza não só mental mas também física, é o lugar ideal para deixar fluir a criatividade. 
O espaço criativo é tão mais produtivo quanto mais for encarado como um espaço de trabalho: limpo, organizado e sem excesso de estímulos e distrações. Quanto mais clean, mais dificilmente abrirá portas aos devaneios que nos afastam das nossas intenções de criar. 
Se eu ponho isto em prática? Não. Estou em progresso. Se o Artur põe isto em prática? Eu cá acho que sim, e tenho sorte em tê-lo como bom exemplo :-) 



Minimalismo como coador de ideias 

O minimalismo do "lado de dentro" é o mais inquietante e mais difícil de trabalhar, mas é também o que traz efeitos mais impactantes. Não funciona numa lógica muito diferente daquela que é  lógica "de fora", de desimpedir caminhos para ir ao encontro do que tem mais valor para nós. Ao nível da criatividade, permite-nos sobretudo trabalhar o "filtro" daquilo em que vale a pena ou não estarmos a investir o nosso tempo e recursos criativos. Ideias e projetos novos são sempre bem-vindos, mas temos de perceber que o multitasking é um mito e que a nossa capacidade de dar resposta a várias coisas ao mesmo tempo é muito limitada. Se queremos escrever um livro, aprender mandarim, tocar ukulele, cozinhar pavlovas e ainda costurar vestidos para barbies, temos de assumir que 24h por dia não chegam e que a nossa única alternativa é priorizar os interesses que têm mais valor para nós, cultivando-os com paixão em determinados momentos da nossa vida. Com isto não quer dizer que devamos abandonar ideias e paixões... talvez apenas adiá-las um pouco, de forma a nos concentrarmos realmente naquilo que queremos em determinado momento, e pescá-las novamente mais tarde, quando já sentirmos que concluímos os nossos objetivos para aquele projeto ou interesse que ficou em primeiro lugar. 

Uma boa forma de fazê-lo é termos um "Caderno de ideias", onde apontamos ideias para projetos, obras, coisas soltas que gostaríamos de fazer, mas que por diversas razões, não estão nas nossas prioridades. Um dia, quando tivermos disponibilidade para tal, poderemos então abraçar estas ideias adormecidas e dar-lhes a prioridade que merecem, sem que a frustração dos projetos inacabados e desafios falhados por excesso de coisas a acontecer, se meta no nosso caminho criativo! 



6 comentários:

  1. É com essa definição de minimalismo que convivo e é aquela que mais me faz sentido, porque acredito que não tem que existir uma ausência "de tralha", tem é que existir propósito e bem-estar nesta relação entre nós e os objetos.
    Uma prioridade quando estou a escrever, por exemplo, é manter aquele espaço organizado. Por mais entusiasmante que o caos pareça nas palavras, acaba por ter um efeito oposto na hora de criar

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  2. Gostei. Gostei muito! O meu minimalismo é muito parecido com o teu, Daniela. E se, por um lado, me tem ajudado a reduzir tralha e a não sentir necessidade de comprar coisas que sei que daí a uma semana não me farão feliz, também me tem proporcionado muita calma na hora de me concentrar. Mas acho que vou roubar essa coisa do caderno de ideias, é genial!

    Jiji

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  3. Pessoalmente encontro-me ali a meio, nem minimalista nem caótica.
    Considero importante a organização, sou incapaz de viver num sítio onde tropece nos objectos.
    Como sempre uma reflexão muito bem estruturada.
    Beijinho

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  4. Eu também sou como tu, guardo o que me interessa, o que me inspira, o que me faz feliz e vou deitando fora o que não me acrescenta e só está a ocupar espaço. É assim que me faz sentido!
    Gosto de ter as coisas organizadas do meu jeito e deixo a criatividade nascer. Uns dias mais minimalista, outros menos, o que importa é sentirmo-nos bem :)

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  5. Desde que tenho apostado numa abordagem mais minimalista que me tenho sentido muito melhor :) Também concordo com essa noção de desapego, de que não precisamos de nos livrar daquilo que nos faz feliz. O importante é separar muito bem as coisas e entender o que nos deixa verdadeiramente felizes daquilo que só nos conforta superficialmente.

    PS: Adorei o prato do Comer é como foder 8D

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